- Pela Redação
- 29/05/2023
Carlos Felipe Almeida D’Oliveira
Recentemente, uma personalidade pública, de enorme alcance nas redes sociais, disse que a família tem culpa em casos de suicídio. A declaração feita em meio ao acalorado debate eleitoral para a gestão municipal da maior cidade do país demonstra, não só irresponsabilidade, mas também desconhecimento sobre um fenômeno que é complexo e multifatorial.
Infelizmente, não se trata de um episódio pontual e o Brasil, apesar dos avanços alcançados nos últimos anos, parece ignorar que o suicídio é um problema de saúde pública.
Embora não apresente taxas médias elevadas em um contexto global, é preocupante a tendência crescente de mortalidade por suicídio no Brasil e o aumento dos índices em populações específicas. Entre 2010 e 2021, as taxas de mortalidade subiram 42%, passando para 7,5 suicídios por 100 mil habitantes.
Em 2021, mais de 15.500 pessoas morreram no país em decorrência do suicídio, o que significa uma morte a cada 34 minutos, de acordo com o Ministério da Saúde. Os dados oficiais mostram aumento dos índices na população mais jovem e entre os povos indígenas.
Durante a Assembleia da Organização Mundial da Saúde, em 2013, o Brasil aprovou um acordo de redução da taxa de suicídio em 10% até 2020. Dessa data até então, como o tema foi tratado? Como as ações foram dirigidas para as populações com maior taxa de suicídio, aquelas que elevam a taxa nacional de mortalidade?
Não encontramos respostas que permitam uma conclusão sobre o impacto das ações no comportamento suicida da população nesse período, inclusive porque o problema não foi considerado prioritário e, portanto, suas ações, mesmo quando realizadas, não foram coordenadas dentro de uma proposta estratégica.
Por isso, a Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio (ABEPS) chama a atenção das autoridades federais, mais especificamente do Ministério da Saúde, para a urgência em reativar o Comitê Gestor responsável pela implantação da Política Nacional de Prevenção da Automutilação e do Suicídio.
Criado em 2020, o comitê foi dissolvido há um ano e meio para designação de nova composição – após a mudança na gestão federal –, o que até agora não ocorreu. Sem um comitê gestor funcionando, atrasamos ainda mais a implantação de ações planejadas e duradouras, embasadas cientificamente e com dotação orçamentária. A formação de Comitês locais, municipais ou regionais, pode constituir experiências de organização na sociedade em torno de um problema que a impacta. É importante a participação de associações diversas de profissionais e comunitárias, forças de segurança, instituições religiosas, associações de sobreviventes enlutados e todos que queiram participar, motivadas pelo problema do suicídio em um determinado ambiente.
A prevenção do suicídio exige ações coordenadas em várias esferas. O Congresso Brasileiro de Prevenção do Suicídio é o espaço para debater abordagens inovadoras, pesquisas recentes e estratégias eficazes na prevenção do suicídio. O evento trata de temas como as políticas públicas de prevenção, suicídio e envelhecimento, as novas tecnologias, prevenção no contexto escolar e o impacto nas populações indígenas.
Precisamos falar de prevenção do suicídio o ano todo, não apenas no mês de setembro. Sabemos que não é tarefa fácil e nenhuma sociedade, em tempo algum, conseguiu impedir todos os casos. Mas, se não todas, considerável porção de mortes pode ser evitada.
Carlos Felipe Almeida D’Oliveira é médico e presidente da Associação Brasileira de Estudos e Prevenção do Suicídio (ABEPS)
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