- Pela Redação
- 29/05/2023
Correio Braziliense
Parte da oposição tenta intensificar a pressão pela votação de uma anistia ampla, geral e irrestrita aos condenados pelos atos de 8 de janeiro. Outros indicam aceno à dosimetria. O tema está travado no Congresso, em meio à resistência da base governista de que o assunto avance na pauta. Enquanto deputados e senadores da direita avaliam que a anistia total é essencial para manter competitividade eleitoral em 2026, aliados do Palácio do Planalto afirmam que qualquer projeto nesse sentido será vetado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na última terça-feira, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) divulgou vídeo defendendo que apenas uma anistia total pode "pacificar o país" e impedir que a direita seja varrida das eleições de 2026. Segundo ele, mesmo que o chamado "PL da dosimetria" — que prevê revisão das penas dos condenados — seja aprovado, a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) continuará limitando a participação de lideranças de direita. "Certamente, passa longe de pacificar o país, condena ao exílio perpétuo todos aqueles perseguidos que estão hoje fora do país, e também coloca a direita fora da eleição de 2026."
No mesmo dia, a oposição convocou um protesto em Brasília, previsto para a próxima terça-feira, às 16h, em meio à agenda legislativa, com o objetivo de pressionar pela inclusão da anistia na pauta da Casa.
A tentativa de avançar com a pauta, no entanto, enfrenta barreiras dentro e fora do Legislativo. Em reunião com sindicalistas, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator da proposta alternativa de revisão de penas, reconheceu que o momento político é desfavorável. "O relatório é algo muito simples, é um negócio bem curto e grosso, mexer em duas ou três penas e com isso pacificar o país", afirmou em conversa com jornalistas.
O esforço de Paulinho, porém, não convenceu o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que reiterou a posição de que a oposição não aceitará nada menos do que uma anistia "ampla". "Você tentou me convencer, mas não conseguiu (...). Vamos entender (melhor) quando você apresentar o relatório, mas nós, obviamente, vamos usar os recursos regimentais que temos para que fazer as emendas que achamos que possam trazer um texto que nos atenda, porque a dosimetria não nos atende", declarou em coletiva.
Flávio usou as redes sociais, ontem, para cobrar novamente a libertação do pai, que completou dois meses preso. Em uma das postagens, o parlamentar afirmou que "o Brasil não pode permitir que o maior líder da direita seja um preso político" e defendeu que "democrático e justo é libertar Bolsonaro".
Nos bastidores, a cúpula do PL pressiona para que a medida em discussão contemple Bolsonaro, condenado pelo STF a mais de 27 anos e 3 meses de prisão. Essa condição, considerada "inaceitável" pela base governista, é o principal ponto de impasse.
Deputados ligados ao governo afirmaram em entrevista ao Correio que a anistia não terá espaço no Congresso. A deputada Maria do Rosário (PT-RS) foi firme ao dizer que, se a proposta avançar, Lula vetará. "A anistia é um projeto sem futuro. Não vamos permitir que essa pauta volte à tona como chantagem (...). O presidente Hugo Motta tem responsabilidade de enterrar de vez esse assunto e deixar a questão de penas para o Judiciário, e não para nós", disse.
Daiana Santos (PCdoB-RS) apontou que a proposta representa uma afronta ao sistema judiciário e à democracia. Segundo ela, "isso não é negociação. É uma tentativa de livrar Bolsonaro da cadeia. Nós não vamos pactuar com esse deboche". "Ou a gente trata com respeito e responsabilidade as pautas que são importantes para o povo, ou, então, a gente vai servir de chacota", emendou.
Além da resistência ideológica, o clima político também pesa contra a anistia. A recente derrota da chamada "PEC da Blindagem", que ampliava prerrogativas parlamentares, deixou sequelas no Congresso e aumentou a cautela do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Ele tem repetido que é hora de "tirar pautas tóxicas" da frente e priorizar temas de interesse popular, como a reforma administrativa, o pacote de segurança pública e projetos de impacto social, a exemplo da ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda, aprovada por unanimidade na semana passada.
Nos últimos meses, propostas como a acumulação de salários e aposentadorias, o aumento do número de deputados e o projeto de anistia mancharam a imagem da Câmara. Agora, a estratégia de Motta é tentar recuperar credibilidade apostando em votações com maior aceitação popular, a expectativa é de que nesta semana avance o pacote da segurança pública.
Divergências internas
Entre aliados da oposição, não há consenso. O deputado Sargento Fahur (PSD-PR) reconheceu que a dosimetria não resolve a situação, mas ponderou que a ausência de anistia pode reduzir o capital político da direita. "Com certeza, perderíamos um pouco de capital político, de força, mas não a ponto de ser varridos. A direita é muito forte. Se Lula vetar (anistia), nós vamos trabalhar para derrubar o veto."
O deputado Alfredo Gaspar (União-AL), por sua vez, destacou que o tema tem apelo dentro do Congresso, mas depende da decisão da presidência da Câmara. "A urgência foi uma boa demonstração de simpatia da Casa pela temática. É uma matéria que o plenário tem interesse de levar adiante, mas a pauta depende da presidência. A expectativa é de que Motta coloque em votação e deixe a Casa decidir. Cada parlamentar terá sua posição, mas não pode ficar travado por interferência externa", afirmou.
Outros, como a deputada Bia Kicis (PL-DF), mantêm um discurso duro alinhado com os filhos de Bolsonaro: "Somos favoráveis apenas à anistia ampla, geral e irrestrita. Não aceitaremos manobras como dosimetria. Os perseguidos do dia 8/1, quase todos inocentes, não aceitam a pecha de criminosos". O deputado Mauricio Marcon (Podemos-RS) também defendeu que apenas o perdão total é constitucional. "Dosimetria não faz sentido. A Constituição é clara: anistia é prerrogativa do Congresso", enfatizou.
Entre a base governista, a leitura é de que a insistência da oposição é menos sobre Justiça e mais sobre sobrevivência política. Com Bolsonaro condenado e ainda sem um possível sucessor, a anistia seria a última cartada para manter lideranças no jogo eleitoral de 2026. Para o governo, a sociedade rejeita a medida, e insistir nela pode isolar ainda mais a direita. O impasse, por ora, mantém o tema fora da agenda prioritária da Câmara.
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