Parto de urgência: a obrigação das operadoras de saúde

JAQUELINE LARRÉA



Jaqueline Larréa

O direito à assistência ao parto no Brasil é uma questão de saúde pública e dignidade para as mulheres. No entanto, quando se trata dos planos de saúde, a cobertura do parto pode variar conforme o tipo de contratação e o período de carência estabelecido no contrato. Isso levanta um debate importante: as operadoras de saúde são obrigadas a cobrir partos quando a beneficiária ainda está em período de carência?

A resposta não é absoluta. Embora a legislação permita que as operadoras exijam o cumprimento da carência de 300 dias para partos a termo, essa regra não se aplica a casos de urgência e emergência.

Quando há risco para a vida da mãe ou do bebê, a operadora tem o dever de garantir o atendimento, independentemente da carência.

A Regra da Carência e as Exceções

Nos contratos de planos de saúde, a Lei 9.656/98 permite que as operadoras estabeleçam um período de carência de 300 dias para partos a termo, ou seja, para gestações que transcorrem normalmente até o final do terceiro trimestre. Assim, se a beneficiária contratar um plano de saúde já grávida, em regra, o parto programado poderá não ser coberto caso ocorra dentro desse período.

Contudo, essa carência não pode ser aplicada quando há necessidade de um parto de urgência ou emergência.

 De acordo com o art. 12, V, “c” da Lei 9.656/98, as operadoras devem garantir a cobertura integral do atendimento de urgência e emergência, após 24 horas de vigência do contrato.

Isso significa que, se uma gestante apresentar complicações como trabalho de parto prematuro, ruptura prematura da bolsa, hipertensão grave, hemorragia ou sofrimento fetal, a operadora tem a obrigação de cobrir o parto, independentemente da carência contratual.

Negativas Indevidas e seus Impactos

Apesar da clareza da legislação, muitas operadoras negam indevidamente o atendimento com justificativas abusivas, como:

* Alegação de que o parto é “eletivo” (mesmo quando há risco iminente à mãe ou ao bebê).

* Exigência de cumprimento da carência mesmo em casos de urgência.

* Tentativa de restringir a cobertura a determinados hospitais, mesmo quando não há vaga disponível.

Essas negativas podem ter consequências graves para a saúde materno-infantil, atrasando atendimentos essenciais e levando mulheres a recorrer ao SUS de última hora sem planejamento.

Nos tribunais, há inúmeras decisões reconhecendo que, se há risco iminente à saúde da gestante ou do bebê, a operadora deve cobrir integralmente o parto. Além disso, se a negativa causar sofrimento excessivo ou danos à saúde, a operadora pode ser condenada a compensar a paciente por danos de ordem moral, além de indenizar danos materiais.

O Que Fazer Diante de Uma Negativa Indevida?

Se a operadora de saúde negar a cobertura do parto em um caso de urgência, a beneficiária pode:

1. Solicitar a justificativa da negativa por escrito – Isso pode ser usado como prova em reclamações e ações judiciais.

2. Registrar uma reclamação na ANS – por telefone (0800 701 9656) ou pelo site da agência há canais de denúncias rápidas.

3. Acionar o Procon – O órgão pode intervir para garantir o cumprimento dos direitos da gestante.

4. Recorrer à Justiça com um pedido de liminar – Em situações graves, uma ação pode obrigar a operadora a cobrir o parto imediatamente.

A Justiça tem se posicionado de forma favorável às gestantes em casos de urgência, garantindo o atendimento e condenando operadoras que desrespeitam esse direito.

Conclusão

O direito ao parto dentro de um plano de saúde não é absoluto quando a beneficiária está dentro do período de carência. Porém, nos casos de urgência e emergência, a operadora não pode se recusar a cobrir o atendimento, sob pena de colocar vidas em risco e violar normas expressas da legislação e da ANS.

Por isso, é essencial que as gestantes conheçam seus direitos e saibam como agir diante de negativas indevidas. O parto não pode ser tratado como um privilégio, mas sim como um evento essencial da assistência à saúde da mulher e do bebê.

Se você ou alguém que conhece passou por essa situação, denuncie. Informar-se é o primeiro passo para garantir um parto digno e seguro.

Lembre-se: a saúde é um direito, não hesite em exigir o que é seu por direito.

Jaqueline Larréa é advogada e sócia do escritório Larréa, Larréa e Menezes, atua há mais de uma década na defesa de direitos relacionados à saúde. Siga nas redes sociais: @jaquelinelarrea / @llm.advogadosassociados

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